Os gêmeos João Pedro e João Gabriel entraram no BBB 25 como dupla e estão agora individualmente lutando pelo milionário prêmio. Durante a trajetória dos irmãos na casa, ao vencerem Provas do Anjo e do Líder, eles surpreenderam o público com as formas que comemoram cada vitória. Carícias, beijos e aproximações físicas diversas despertaram dúvidas nos telespectadores. Afinal, há limites para a demonstração de afeto entre irmãos? A pedido da coluna GENTE, a psicóloga Alessandra Araújo analisa a situação:
“Quando irmãos, especialmente gêmeos idênticos, se envolvem em comportamentos íntimos ou sexuais, estamos diante de um fenômeno que pode ser chamado de incesto fraterno, algo que vai além da definição legal e entra em campos profundos da psicologia, da ética e da cultura. Embora o termo ‘incesto’ normalmente se refira à relação sexual entre parentes próximos, no campo da psicologia clínica, é fundamental entender que essas situações podem estar relacionadas a dinâmicas complexas do desenvolvimento psicossexual, traumas, falhas no processo de individuação (que é a diferenciação do eu em relação ao outro, algo especialmente desafiador entre gêmeos), ou até mesmo históricos de negligência, abuso ou confusão de papéis familiares. No caso de gêmeos idênticos, há um vínculo extremamente forte desde a gestação, e em muitos casos, a simbiose entre eles pode dificultar a construção de uma identidade separada. Quando, por alguma razão, esse vínculo se expressa de forma erótica ou sexual, pode indicar um limite comprometido entre o eu e o outro, carência emocional, isolamento social, ou até mesmo curiosidade sexual mal elaborada — especialmente se isso acontece na adolescência. Psicologicamente, as consequências podem ser importantes, tanto para o vínculo fraterno quanto para a saúde mental de cada um. Pode haver: culpa intensa; vergonha e medo de julgamento; dificuldades de identidade sexual; ansiedade, depressão ou dissociação; problemas com vínculos futuros (afetivos e sexuais).
Além disso, esse tipo de experiência pode causar rompimentos emocionais entre os irmãos e afetar todo o sistema familiar, especialmente se for descoberto ou revelado em um ambiente que condena fortemente esses comportamentos, o que é comum na maioria das culturas. Se esse tipo de situação ocorrer, é fundamental buscar acompanhamento psicológico especializado, sem julgamento, com acolhimento e escuta ética, para que essas pessoas possam compreender o que aconteceu, trabalhar as emoções envolvidas, restaurar os próprios limites e seguir com o desenvolvimento emocional e sexual de forma mais saudável. Mesmo quando há consentimento entre irmãos gêmeos (ou outros parentes próximos) e quando a relação não é fisicamente forçada, ainda assim estamos falando de uma dinâmica que carrega implicações profundas para o desenvolvimento emocional, psicossexual e relacional de cada indivíduo. O consentimento, nesses casos, não elimina necessariamente os riscos ou as consequências dessa vivência.
Por que o consentimento pode ser insuficiente? Em relações entre irmãos, especialmente gêmeos, existe uma história de vínculo emocional profundo e de convivência simbiótica desde a gestação. Isso significa que os limites da individualidade podem estar mais frágeis ou difusos, o que pode levar a confusão entre amor fraterno, carinho físico e desejo sexual. O que uma pessoa interpreta como “consentimento” pode, na verdade, estar atravessado por uma imaturidade emocional, necessidades afetivas não elaboradas, ou condições de desenvolvimento psicossexual não resolvidas. Além disso, a sociedade estabelece tabus em torno do incesto não apenas por razões morais, mas também por reconhecer que relações familiares carregam assimetrias emocionais, papéis estabelecidos e laços que tornam essas vivências potencialmente danosas, mesmo sem violência explícita.
E se os envolvidos não relatam sofrimento? Ainda assim, é preciso investigar com cuidado. Em muitos casos, o sofrimento pode não aparecer de imediato, mas pode emergir mais tarde, quando essas experiências forem revisitadas à luz de novos contextos, como envolvimentos românticos, o surgimento de filhos, ou a necessidade de expor a verdade a terceiros. Por isso, mesmo quando não há dor ou queixa explícita, é fundamental buscar ajuda terapêutica especializada, que possa acolher esse relato sem julgamento, mas com escuta ética, técnica e capaz de ajudar cada pessoa a elaborar essa vivência e compreender seus efeitos.
Mas por que é necessário buscar a ajuda especializada mesmo na ausência de dor? Mesmo na ausência de dor física ou de pressão explícita, experiências sexuais entre irmãos podem gerar, com o tempo, sentimentos de culpa ou vergonha, além de provocar confusão na identidade sexual e relacional. Também é comum que surjam dificuldades para estabelecer vínculos afetivos saudáveis com outras pessoas fora do núcleo familiar, o que pode levar a um certo isolamento emocional ou social. Em casos nos quais uma das partes se arrepende ou deseja interromper a relação, pode haver um rompimento doloroso do vínculo fraterno. Além disso, essas vivências podem comprometer o processo de individuação, dificultando que o sujeito se perceba como um ser separado e autônomo. Vale destacar que a sexualidade é uma dimensão profundamente sensível da vida psíquica, e seu desenvolvimento saudável depende de um ambiente que favoreça o exercício do desejo com liberdade, respeito à alteridade e com limites claros — aspectos que tendem a ser enfraquecidos em uma dinâmica sexual entre irmãos”.