O partido Siumut, atualmente no governo da Groenlândia, informou na quinta-feira 6 que planeja realizar um referendo de independência após a eleição geral no mês que vem. Apesar da ilha no Ártico, que faz parte da Dinamarca, ter uma administração autônoma, a questão se tornou mais urgente pelo interesse expresso do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, em anexar o território cuja crescente importância geopolítica está conectada com o aquecimento global.
Na quarta-feira 5, a Groenlândia convocou uma eleição geral para o dia 11 de março (as votações ocorrem a cada quatro anos). As principais questões na campanha eleitoral incluem a independência do território, bem como seu relacionamento com a Dinamarca e os Estados Unidos de Trump.
Depois do pleito, o Siumut, um dos membros da coalizão bipartidária que governa a ilha, planeja invocar um artigo de uma lei de 2009 que concedeu mais autonomia à Groenlândia, incluindo o direito de negociar a independência total, para convocar o referendo. A informação foi confirmada à agência de notícias Reuters pela porta-voz política da legenda, Doris Jensen. Segundo ela, o território precisa ser independente da Dinamarca para poder negociar seu futuro com Washington.
“Até que nosso país ganhe status de um Estado independente, nossas oportunidades de participar oficialmente de quaisquer negociações serão limitadas”, defendeu.
Em entrevista à emissora dinamarquesa DR, o líder do Siumut, Erik Jensen, disse esperar que a votação sobre a independência acontecesse “dentro do próximo período eleitoral”, mas não foi específico.
Cobiça dos EUA e mudanças climáticas
Todos os cinco partidos políticos no parlamento disseram que não querem que a Groenlândia se torne parte dos Estados Unidos. Além disso, uma pesquisa de opinião publicada na semana passada indicou que 85% dos groenlandeses se opõem à proposta de Trump, e quase metade afirmaram que enxergam a empreitada do republicano como uma ameaça.
Rica em recursos minerais inexplorados, a importância geopolítica da Groenlândia vem aumentando com as mudanças climáticas, apesar do risco que elas significam para o mundo inteiro. Devido ao aquecimento das temperaturas, estima-se que cerca de 28, 5 mil km² (quase 20 vezes a área do município de São Paulo) das camadas de gelo e geleiras da Groenlândia derreteram ao longo das últimas três décadas. Se o gelo da ilha se desfizer completamente, isso poderia fazer o nível do mar subir até 7 metros, de acordo com a agência espacial Nasa.
Mas também é justamente o recuo do gelo da Groenlândia que pode abrir novas áreas para perfuração de petróleo e gás (acredita-se que o Ártico detenha 13% das reservas de petróleo não exploradas do mundo e 30% do gás natural), bem como para exploração de minerais críticos. A ilha tem reservas de 43 dos 50 minerais considerados “críticos” pelo governo americano, e essenciais para a transição a uma economia verde. Só as terras raras que já foram descobertas somam 42 milhões de toneladas desses recursos, cerca de 120 vezes mais do que o mundo inteiro minerou em 2023.
Além disso, o tráfego de navios no Ártico aumentou 37% na última década, de acordo com um relatório recente do Conselho Ártico, à medida que o gelo marinho diminuiu. Mais derretimento poderia abrir ainda mais rotas comerciais – e quem obtiver o controle delas pode se beneficiar de trajetos mais curtos e taxas menores.
Mas a ilha em si, por enquanto, pode aproveitar pouco dos benefícios colhidos ao preço altíssimo do aquecimento global, já que é extremamente dependente dos subsídios da Dinamarca para sua economia, apesar de ter deixado de ser colônia em 1953. Sua principal atividade é a pesca.
Jensen (o líder do Siumut) disse que qualquer decisão sobre a independência deve ser tomada com total consciência das implicações.
“A população não pode ter dúvidas sobre as consequências. Temos uma sociedade de bem-estar que deve funcionar, mas há alguns aspectos econômicos que também precisamos analisar”, ponderou.
O social-democrata Siumut detém 10 assentos no parlamento, de um total de 31. O terceiro maior partido do país, o Naleraq, também disse que quer cortar laços com a Dinamarca imediatamente.