Há duas semanas, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) recebeu do ditador Nicolás Maduro uma doação de 180 mil hectares de terras no estado de Bolívar, no sul da Venezuela, perto da fronteira com o Brasil. Os sem-terra farão uma parceria com o governo venezuelano para criar na região a Pátria Grande do Sul, “a maior comuna socialista do país”, segundo a propaganda oficial. É a realização de um antigo projeto.
O MST já pensou em criar um território independente no Brasil. Presidente do Incra — o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária — no governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, o ex-deputado federal Xico Graziano disse a VEJA que, na época em que dirigia o órgão, os serviços de inteligência descobriram um plano para montar o que os militantes chamavam de “República Socialista Guarani”.
República Socialista do MST
A República Socialista dos sem-terra ficaria em Mato Grosso do Sul, próximo à fronteira com a Bolívia. “A gente monitorava o MST e a ideia deles era criar uma espécie de enclave, uma região autônoma que se chamaria República Socialista Guarani”, diz Graziano.
O ex-presidente do Incra lembra que, nessa época, o movimento estava radicalizado, promovia invasões em vários lugares do país e alimentava ideias revolucionárias. “Eu me lembro de conversar com o general Alberto Cardoso sobre esse assunto”, diz Graziano, fazendo referência ao ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, que cuidava dos assuntos de inteligência do governo.
Os planos do MST não foram adiante, mas, depois disso, o movimento foi acompanhado de perto pelos serviços de inteligência, inclusive com agentes infiltrados. “Havia uma preocupação que eles tivessem vontade de promover um domínio territorial, para mostrar a viabilidade do socialismo que eles propõem”, ressalta Graziano.
No caso das terras venezuelanas, o enclave teria outros objetivos. No ano passado, Maduro promulgou uma lei criando a província de Essequibo, território reconhecido internacionalmente como sendo da Guiana. A região, desabitada, de floresta densa e rica em petróleo, é disputada pelos dois países há mais de um século.
O projeto do MST fica a 230 quilômetros da área em litígio. “Ceder terras para o MST é uma forma de Maduro povoar e reforçar a posição da Venezuela na região”, avalia o cientista político venezuelano Carlos José León. “E, com a presença do MST, ainda pode envolver o Brasil num eventual conflito”, acrescenta, com um certo exagero.