A Argentina está elaborando um projeto de lei para eliminar o femicídio do seu Código Penal, após o presidente Javier Milei declarar que “o feminismo radical é uma distorção do conceito de igualdade” durante o Fórum Econômico Mundial em Davos, na semana passada.
“Chegamos ao ponto de normalizar o fato de que, em muitos países supostamente civilizados, se matarmos uma mulher, chama-se feminicídio”, afirmou Milei em seu discurso. “E isso implica uma punição mais grave do que se matarmos um homem, simplesmente com base no sexo da vítima. Isso faz com que, legalmente, a vida de uma mulher valha mais do que a de um homem”.
Após a fala do presidente argentino, o ministro da Justiça, Mariano Cúneo Libarona, anunciou que o governo pretende aprovar uma reforma no Congresso para eliminar o conceito legal de feminicídio.
“Esta administração defende a igualdade perante a lei consagrada na nossa Constituição Nacional”, escreveu Cúneo Libarona no X (antigo Twitter). “Nenhuma vida vale mais do que outra”.
A proposta de Milei foi criticada por diversas organizações de direitos humanos. Mariela Belski, diretora-executiva da Anistia Argentina, alertou que a revogação da categoria legal de feminicídio colocaria mulheres e meninas em maior risco.
“Milei nega a violência que nos mata diariamente e tenta apagar o progresso que o feminismo e a sociedade como um todo fizeram em termos de legislação para tornar o machismo extremo visível e puni-lo. Violar as leis e a Constituição é um crime”, afirmou a ONG Mumalá (Mujeres de La Matria Latino-Americana).
Feminicídio na Argentina
O feminicídio, definido como o assassinato de mulheres cometido com base em seu gênero, ou seja, quando a vítima é morta exclusivamente pelo fato de ser mulher, foi incorporado ao Código Penal argentino em 2012 e é punível com prisão perpétua.
Apesar do risco de penas severas, o número de feminicídios na Argentina continua elevado. Em 2024, foram registrados 295 casos, enquanto 322 ocorreram em 2023 e 242 em 2022, segundo o Observatório do Feminicídio da Provedoria de Justiça Nacional.
Direito das mulheres em risco
Desde que assumiu a presidência em dezembro de 2023, Milei tem promovido cortes em políticas de gênero. Seu governo extinguiu o Ministério da Mulher e a Subsecretaria de Proteção contra a Violência de Gênero, além de reduzir programas de apoio a vítimas. A Argentina também foi o único país a votar contra uma resolução das Nações Unidas para combater a violência digital contra mulheres, e Buenos Aires deu intenção de detonar a declaração final do G20, em cúpula no Rio de Janeiro, por abordar a desigualdade de gênero.
O governo Milei também busca revogar leis de paridade de gênero em listas eleitorais, cotas de emprego para minorias sexuais e documentos de identidade não binários.