A imagem de um iPhone reluzente nas mãos de um jovem americano é um símbolo moderno do “Sonho Americano”. Mas esse símbolo pode em breve se tornar mais caro — e menos onipresente. Em sua cruzada protecionista, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, pode estar prestes a sabotar o maior ícone do capitalismo americano: a Apple. As tarifas propostas por Trump sobre produtos fabricados na China — e, pela primeira vez, também no Vietnã e na Índia — podem elevar em até 43% o preço dos iPhones, calcula a Rosenblatt Securities, corretora e empresa de pesquisa para o mercado financeiro. Isso significa que um modelo básico de US$ 799 poderia ultrapassar os US$ 1.100, enquanto a versão mais avançada poderia chegar a quase US$ 2.300.
As tarifas impostas por Trump atingem em cheio países asiáticos que se tornaram uma extensão das linhas de produção de empresas americanas. Os produtos vindos da China serão taxados em 34%, do Vietnã em 46% e da Índia em 26% — nações que hoje abrigam uma parcela significativa da manufatura da Apple, ameaçando sua capacidade de manter margens de lucro sem repassar os custos ao consumidor.
A Apple detém cerca de 60% do mercado americano, segundo a Counterpoint Research. No entanto, essa liderança pode se fragilizar rapidamente se os consumidores derem preferência a alternativas que entregam desempenho semelhante por menos dinheiro. Segundo os analistas, atualmente o público já demonstra sinais de cansaço com a falta de inovações realmente disruptivas e, diante dos preços inflacionados, pode começar a migrar para opções mais acessíveis. Essa conjuntura cria espaço para um desfecho até recentemente inimaginável: a ascensão da Samsung no mercado americano. Com preços mais competitivos e fortes investimentos em telas dobráveis e inteligência artificial embarcada, a Samsung desponta como uma alternativa viável — e até mais atraente — aos produtos da Apple. lém disso, a Samsung tende a ser menos impactada pelo tarifaço. Embora também mantenha parte da produção nos países asiáticos que se tornaram alvo das medidas de Trump, a companhia fabrica um componente-chave em casa: os semicondutores. E, como a Coreia do Sul foi atingida por uma tarifa relativamente mais branda, de 25%, o impacto sobre seus custos deve ser menor.
Trump argumenta que, ao tornar a produção no exterior menos vantajosa, incentivará empresas como a Apple a trazerem suas fábricas de volta para solo americano, promovendo uma nova onda de reindustrialização. Mas a proposta ignora dois obstáculos estruturais. Primeiro, a produção de um smartphone envolve uma cadeia global altamente fragmentada, com centenas de fornecedores especializados — replicar esse ecossistema nos Estados Unidos levaria décadas e exigiria investimentos bilionários. Segundo, nem os consumidores nem o mercado financeiro parecem dispostos a esperar tanto tempo por uma adaptação.
O impacto imediato já pode ser sentido. Na última quinta-feira, as ações da Apple despencaram 9,3%, o pior desempenho desde março de 2020, quando a pandemia abalou os mercados. O recado de Wall Street é claro: a Apple enfrenta um choque potencialmente devastador, que ameaça tanto seu modelo de negócios quanto sua posição de hegemonia no mercado global de tecnologia.