O Parque Científico de Hsinchu, localizado na costa oeste de Taiwan, é um exuberante campus empresarial, cercado por verde, com ruas bem planejadas e de limpeza impecável.
Mas seus edifícios modernosos não chegam a despertar a atenção dos visitantes, que dificilmente sabem que ali está no epicentro de algumas das fábricas mais importantes do mundo.
Hsinchu é hoje o Vale do Silício de Taiwan, um polo tecnológico que conecta estudantes desde a escola até a universidade e, posteriormente, à indústria de semicondutores, que lidera o setor global e é essencial para as cadeias de suprimentos mundiais.
Os chips, ou semicondutores, são componentes fundamentais para o funcionamento de dispositivos eletrônicos, como computadores, celulares e carros.
Um único chip pode conter dezenas de bilhões de transistores, e os mais avançados, quase sempre fabricados em Taiwan, são ainda mais complexos.
Desde que Donald Trump voltou à presidência dos Estados Unidos, em janeiro, os semicondutores de Taiwan ganharam destaque após o republicano reiterar uma antiga acusação de que Taiwan roubou negócios dos americanos.
Trump, inclusive, questionou se Washington deve continuar apoiando Taiwan nos próximos anos.
“Eles tomaram quase 100% da nossa indústria de chips”, afirmou. “Nunca deveríamos ter deixado isso acontecer.”
Em Taiwan, a postura de Trump teve péssima repercussão.
Isso porque os Estados Unidos são o principal parceiro de segurança da ilha diante das ameaças de anexação pela China.
A ferocidade de Trump é explica pela vantagem de Taiwan no segmento mais avançado da indústria global de semicondutores.
Atualmente, a ilha produz cerca de 90% dos semicondutores mais avançados do mundo, principalmente por meio da Taiwan Semiconductor Manufacturing Co Ltd (TSMC), a maior fabricante global e uma das principais fornecedoras de empresas como Apple e Nvidia.
Empresas como a TSMC consolidaram sua liderança por meio de investimentos intensivos em pesquisa e desenvolvimento, além de uma eficiência de cair o queixo.
Graças a isso, conseguem inserir mais transistores em chips cada vez menores do que seus concorrentes.
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Além disso, a mão de obra taiwanesa é altamente qualificada, e os empregos no setor de semicondutores são bem remunerados, ainda que exijam alta dedicação.
As leis trabalhistas de Taiwan são mais flexíveis do que as dos Estados Unidos, permitindo jornadas extensas e maior produtividade.
Trabalhar na TSMC ou em empresas similares é considerado um prestigiado caminho para um futuro promissor.
As empresas podem operar com três turnos chefiados por profissionais de altíssima qualidade.
Além disso, o ecossistema de indústrias secundárias que surgiu para apoiar os fabricantes de chips fortalece ainda mais essa vantagem competitiva.
Para atingir o Olimpo da indústria High Tech Taiwan precisou de 40 anos em pesquisas para desenvolver sua indústria de semicondutores, tornando sua substituição praticamente impossível.
Embora outros países tentem alcançar Taiwan, relatórios indicam que sua vantagem competitiva está, na verdade, se alargando.
E esse monopólio taiwanês sobre um componente essencial para a tecnologia global tem gerado preocupações sobre a fragilidade das cadeias de suprimentos, especialmente diante da possibilidade de uma invasão chinesa.
O mundo teve uma amostra dos impactos de uma crise na cadeia de suprimentos durante a pandemia, quando o fechamento de fábricas resultou em uma escassez global de chips, atrasando a produção e elevando os preços de carros e outros produtos.
Diante dessa vulnerabilidade, países buscaram diversificar suas fontes de fornecimento, incentivando empresas taiwanesas a instalarem novas fábricas no exterior. Mas os resultados são tímidos.
Graças a incentivos oferecidos pelos Estados Unidos, parte da produção taiwanesa está sendo transferida para lá.
A TSMC, por exemplo, anunciou investimentos de 100 bilhões de dólares em novas fábricas, incluindo um complexo no estado do Arizona.
Mas especialistas de Taiwan apontam dificuldades na reprodução do modelo desse Tigre Asiático, devido a diferenças nas leis trabalhistas e nas expectativas em relação aos trabalhadores.

Para Taiwan, o domínio na indústria de semicondutores é uma vantagem estratégica do ponto de vista da segurança nacional.
Analistas de política internacional se referem a esse setor como um “escudo de silício”, um fator que incentiva a comunidade internacional a evitar que Taiwan caia sob o controle de Pequim.
Em resposta aos comentários de Trump, autoridades taiwanesas destacaram a solidez da relação entre EUA e Taiwan, além da ampla cooperação internacional no setor de chips — que inclui diversas empresas estrangeiras operando no país.
No entanto, também reforçaram a intenção de manter a pesquisa e desenvolvimento (P&D) em território nacional, garantindo sua posição de liderança incontestável nessa indústria pilar da economia mundial.
O repórter viajou a Taipé a convite do Conselho de Desenvolvimento do Comércio Exterior de Taiwan (TAITRA).