A porta-voz da Casa Branca, Karoline Leavitt, afirmou nesta quarta-feira, 5, que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, não se comprometeu a enviar militares americanos para a Faixa de Gaza, não pretende que seu país pague pela reconstrução do enclave e mencionou uma “realocação temporária” dos palestinos, contradizendo partes de sua proposta de tomada do território anunciada na véspera.
Em coletiva de imprensa, Leavitt disse a repórteres que o presidente acredita que Washington precisa se envolver na reconstrução de Gaza “para garantir a estabilidade na região”, mas que “não vão pagar” por isso. Também disse que soldados não vão “pisar lá”, embora não tenha especificado como os Estados Unidos poderiam tomar o controle do território sem usar força militar.
Ela ainda negou que a proposta de Trump de tirar os palestinos do enclave seja permanente, afirmando que o presidente americano está “comprometido com a realocação temporária dos que estão lá”.
Leavitt não foi a única a contradizer o presidente. Falando com repórteres na Guatemala, o secretário de Estado americano, Marco Rubio, sugeriu duas vezes que Trump estava apenas propondo limpar e reconstruir Gaza, não reivindicar posse indefinida do território. Steve Witkoff, enviado especial para o Oriente Médio do governo, declarou a senadores republicanos em um almoço a portas fechadas que seu chefe “não quer colocar nenhum soldado dos Estados Unidos no território, e ele não quer gastar nenhum dólar americano” em Gaza, informou o jornal The New York Times.
Mais cedo, quando questionado pela imprensa no Salão Oval sobre as reações negativas às suas declarações sobre o território palestino, Trump negou que seu plano tenha sido mal recebido: “Todo mundo ama.”
O que disse Trump
Na terça-feira 4, durante entrevista coletiva ao lado de Netanyahu, o chefe da Casa Branca já havia afirmado que “todo mundo com quem falei ama a ideia dos Estados Unidos serem donos daquele pedaço de terra”, em referência à Faixa de Gaza.
“Os Estados Unidos assumirão a Faixa de Gaza, e faremos um trabalho com ela também. Nós a possuiremos e seremos responsáveis por desmantelar todas as bombas perigosas não detonadas e outras armas no local”, disse Trump, acrescentando que o país trabalharia para desenvolver economicamente a área.
Questionado por repórteres, Trump afirmou que vislumbra a possibilidade de os Estados Unidos permanecerem no controle de Gaza “no longo prazo” e que o propósito seria levar “estabilidade” ao enclave e ao Oriente Médio. Trump também não descartou enviar tropas americanas a Gaza: “No que diz respeito a Gaza, faremos o que for necessário. Se for necessário, faremos isso”.
Antes, o republicano já havia defendido uma proposta de uma realocação permanente de palestinos da Faixa de Gaza para países vizinhos, dizendo que o enclave é um “local de demolição”. “Espero que possamos fazer algo para que eles não queiram voltar. Quem iria querer voltar? Eles não tiveram nada além de morte e destruição”, afirmou após reunião com Netanyahu, instando Jordânia, Egito e outros países árabes a receberem palestinos.
Condenação geral
A proposta, que segundo o republicano poderia criar uma “Riviera do Oriente Médio”, porém, foi rapidamente condenada pela comunidade internacional. Nesta quarta-feira, o Escritório de Direitos Humanos da ONU, com sede em Genebra, afirmou que “qualquer transferência forçada ou deportação de pessoas de território ocupado é estritamente proibida”.
Anteriormente, o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, disse que o projeto equivaleria a uma “limpeza étnica” e colocaria em risco de “tornar impossível um Estado palestino para sempre”. As propostas de Trump, se realizadas, envolveriam uma população de mais de dois milhões de pessoas.
O representante palestino na ONU, Riyad Mansour, disse que líderes mundiais devem respeitar o desejo dos palestinos de permanecer em Gaza.
“Nossa pátria é nossa pátria, se parte dela for destruída, a Faixa de Gaza, o povo palestino escolheu retornar a ela”, disse ele. “Acredito que os líderes e o povo devem respeitar os desejos dos palestinos”.
A proposta de Trump é a transformação mais radical da posição de Washington sobre o território desde a criação do Estado de Israel, em 1948, e a guerra de 1967, que viu o início da ocupação militar israelense de terras, incluindo Gaza, Cisjordânia e Colinas de Golã. Segundo a lei internacional, tentativas de transferência forçada de populações são estritamente proibidas, e os palestinos, assim como as nações árabes, verão isso como uma proposta clara de expulsão e limpeza étnica dos palestinos de suas terras.
Reações internacionais
Países como França, Espanha, Reino Unido e Rússia se posicionaram contra a medida e condenaram qualquer avanço em direção à retirada de palestinos de suas terras. O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Lin Jian, alertou que irá se opor à “transferência forçada” de palestinos, dizendo defender um governo formado por palestinos para governar para os palestinos como “princípio básico da governança de Gaza no pós-guerra”.
A Arábia Saudita, potência regional com quem Trump tenta fortalecer os laços com Israel, afirmou que não irá normalizar relações com Tel Aviv sem a criação de um Estado palestino e rejeitou qualquer tentativa de deslocar os palestinos de suas terras.
“A Arábia Saudita também reitera sua rejeição inequívoca, anunciada anteriormente, de qualquer violação dos direitos legítimos do povo palestino, seja por meio de políticas de assentamento israelenses, da anexação de terras palestinas ou de tentativas de deslocar o povo palestino de suas terras”, afirmou o Ministério das Relações Exteriores de Riad.