Com mais de 70 deputados e senadores na mira de inquéritos em andamento no Supremo Tribunal Federal, caciques do Centrão e da oposição estão convictos de que há uma emboscada tramada pelo Judiciário e pelo governo Lula para direcionar as operações policiais, controlar a verba que destinam a seus redutos e manter o grupo nas cordas. Em meio à percepção de que a classe política está sob ataque, o incômodo já chegou à cúpula do Congresso – que, em recados velados, avisa que está sendo pressionada a reagir.
Como mostra reportagem de VEJA desta edição, foi apresentado aos presidentes da Câmara e do Senado um pacote de ações a ser gradualmente colocado em prática – o que foi traduzido como uma “prateleira” de reações contra a investida de investigadores e juízes.
A primeira estratégia que vem sendo trabalhada visa dar fim ao secretismo das investigações contra parlamentares. São mais de 80 inquéritos sob sigilo no Supremo envolvendo supostos desvios em emendas, dinheiro público que deputados e senadores encaminham para seus municípios com o objetivo de construir obras, pontes e atender a necessidades locais.
Entre os alvos, é recorrente a reclamação de que nem eles têm acesso às apurações ou conhecem em detalhes os motivos de serem alvos de operações – o que os mantêm em constante suspeição. A ideia seria fazer um questionamento oficial ao STF questionando o nome de todos os parlamentares investigados.
Ministro Flávio Dino entra na mira
Uma das mais recentes investigações sobre as emendas parlamentares foi aberta em dezembro por ordem do ministro Flávio Dino, que criticou a falta de transparência no repasse de 4 bilhões de reais e mandou a Polícia Federal apurar possíveis casos de corrupção.
Outras ações, mais antigas, foram comandadas enquanto Dino era ministro da Justiça, quando, até o ano passado, tinha o controle da PF em suas mãos. Por essa dupla atuação, deputados e senadores colocam a isenção do ministro em xeque e cobram uma reação oficial do Congresso para afastá-lo da relatoria das investigações.
O caminho para isso, conforme o que vem sendo estudado, seria uma ação da advocacia da Câmara ou do Senado apontando a necessidade de impedimento do juiz. Não é, porém, uma tarefa simples. A decisão de tirar Dino do caso teria de partir da Presidência do Supremo e é considerada remotíssima por integrantes do tribunal.
Ação e reação
Há, ainda, medidas mais drásticas. Congressistas ameaçam dobrar a aposta caso a sangria não seja controlada e instaurar procedimentos internos para apurar eventuais abusos e desvios cometidos por parte de quem os investiga.
Um dos caminhos seria abrir uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para depurar se há o uso da máquina estatal contra adversários políticos. O colegiado poderia vasculhar os bastidores das operações e se debruçar, por exemplo, se há preferência em ações que envolvam oposicionistas em detrimento de apurações contra governistas e ainda sobre os métodos praticados pelos agentes para a obtenção de provas.
A CPI também miraria a atuação do STF, a quem cabe determinar as operações e conduzir os inquéritos sigilosos. Mesmo que nenhuma investigação concreta seja levada adiante, se criado, um colegiado como esse tem potencial de tumultuar os trabalhos do Congresso num momento em que o governo Lula enfrenta os seus piores índices de popularidade e depende dos parlamentares para aprovar medidas que agradam o eleitorado, como a isenção do imposto de renda para quem ganha até 5 mil reais.
Outra possibilidade na mesa seria usar a Polícia Legislativa, órgão que também tem competência investigativa, para instaurar um inquérito para apurar a legalidade das ações da PF – o mesmo objeto de uma das CPIs em estudo, mas com a diferença de que ações como quebras de sigilo e diligências se dariam longe dos holofotes e sob o conhecimento apenas da cúpula do Congresso.