Donald Trump tem chocado o mundo com suas barbaridades, como, entre outras, o inédito uso de tarifas como arma, o corte de recursos para universidades, a extinção de agências relevantes e a demissão de funcionários estáveis. Demonstrou analfabetismo econômico em um país que tem sete das melhores universidades do mundo e o maior número de agraciados com o Prêmio Nobel de Economia.
Trump decidiu demolir a ordem mundial baseada em regras, criada por seu próprio país após o fim da Segunda Guerra. Depois disso, o mundo ficou mais próspero. A economia americana foi a que mais se beneficiou. Agora, o caos negará a “nova era de ouro” que ele promete. Fazer a América grande novamente, mesmo que alguma reindustrialização ocorra, é uma utopia. Medida pela mão de obra empregada, a indústria representa 8% do PIB. Uma minúscula parte não pode mover o todo.
As tarifas recíprocas constituem a maior estupidez de Trump. Obscuras, elas são a metade do que supostamente seria o custo imposto por parceiros comerciais. O Brasil aplica 18% nas importações de etanol americano, enquanto os Estados Unidos cobram apenas 2,5% quando adquirem nosso produto, mas a nova regra ainda não foi aplicada ao país. A revista inglesa The Economist estimou que haverá 2,3 milhões de tarifas distintas.
“O caos pode ocorrer nas cadeias de suprimento, que nos últimos trinta anos geraram ganhos de produtividade”
Países ricos cobram tarifas muito baixas. A média americana é 3,3%, a do Reino Unido é 3,8% e da União Europeia é 5%. Isso se explica pelo alto grau de competitividade. Não há necessidade de ampla proteção aduaneira. Assim, os consumidores ganham com importações mais baratas e as empresas pagam menos por partes e componentes, tornando-se mais competitivas. É equivocado dizer, portanto, como o faz Trump, que os EUA são explorados pelos seus parceiros comerciais.
As tarifas recíprocas podem violar o princípio da “nação mais favorecida”, que tem sido aplicado no comércio mundial pelo menos desde o século XIX. Desse modo, qualquer membro da Organização Mundial do Comércio (OMC) é obrigado a adotar a mesma tarifa sobre um dado produto, não importa onde seja fabricado, salvo nos casos de zonas de livre comércio reconhecidas pela OMC. Haveria milhares (ou milhões) de casos em que os parceiros comerciais dos EUA poderiam demandar tratamento igualitário. Claro, Trump não ligará a mínima, pois não se disporia a cumprir a regra, mas a bagunça no comércio global será muito provável.
O caos também pode acontecer nas cadeias mundiais de suprimento, que nos últimos trinta anos geraram ganhos imensos de produtividade. As multinacionais americanas transferiram suas fábricas para a Ásia em busca de eficiência, o que acarretou a espetacular taxa de crescimento da China e lhe permitiu excluir da pobreza 800 milhões de habitantes. De sua parte, os americanos se beneficiaram da queda dos preços dos bens que consomem. Por exemplo, o iPhone custa menos da metade do que custaria se fosse produzido nos EUA. As tarifas recíprocas penalizarão países asiáticos pobres, os americanos e a economia mundial. Quanta estupidez!
Publicado em VEJA de 11 de abril de 2025, edição nº 2939