O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e o bilionário Elon Musk formam uma das mais intrigantes alianças políticas e empresariais dos últimos tempos. De um lado, Trump é um defensor ferrenho da indústria de combustíveis fósseis, promovendo a exploração e uso de petróleo e gás como pilares para impulsionar a economia americana. De outro, Musk é o fundador da Tesla, a maior fabricante de veículos elétricos do mundo, cuja missão é justamente reduzir a dependência global de combustíveis fósseis em favor de energias renováveis.
Assim que tomou posse de seu segundo mandato nesta semana, Trump declarou emergência nacional no setor energético, devido ao aumento dos custos de energia, que pressionam a inflação no país. Ele também prometeu expandir as perfurações de petróleo, um movimento que claramente vai contra o coração do principal negócio de Musk, a Tesla. Além disso, Trump revogou uma ordem de seu antecessor, Joe Biden, que estabelecia a meta de que carros elétricos representassem metade das vendas de veículos novos nos Estados Unidos até 2030.
A revogação da medida parece, à primeira vista, um golpe direto nos interesses da Tesla e, portanto, um ponto de conflito entre Trump e Musk. Afinal, grande parte do valor de mercado da empresa de Musk e da sua própria fortuna bilionária está atrelada ao crescimento do mercado de veículos elétricos. A aposta em combustíveis fósseis contradiz essa visão de futuro.
Contudo, o apoio de Musk a Trump, incluindo uma substancial injeção de capital em sua campanha eleitoral, levanta questões sobre o real alinhamento de interesses entre os dois. Musk agora comanda o recém-criado Departamento de Eficiência Governamental, uma posição que poderia colocá-lo no centro de importantes decisões estratégicas. E, enquanto seus negócios com carros elétricos podem sofrer sob uma administração que favorece o petróleo, Musk tem outro interesse que pode explicar sua proximidade com Trump: o X, antigo Twitter.
Desde que adquiriu a plataforma, o bilionário tem se posicionado como um defensor da “liberdade de expressão”, um conceito que frequentemente se alinha com as críticas de Trump às chamadas “big techs” e suas políticas de moderação de conteúdo. Trump, que já foi banido temporariamente do Twitter em 2021, tem se beneficiado da gestão de Musk na rede social, que relaxou as políticas de moderação e permitiu o retorno de várias figuras polêmicas, inclusive a do republicano.
Musk, por sua vez, também compartilha uma visão menos restritiva em relação ao conteúdo que circula nas redes sociais, incluindo o fim das checagens de fatos, uma prática adotada para combater a desinformação. No início do mês, a Meta, controladora do Instagram e Facebook, anunciou o encerramento de seu programa de verificação de fatos, inicialmente apenas nos Estados Unidos. A empresa planeja substituir o sistema pelas “notas da comunidade”, onde os próprios usuários poderão corrigir informações – um recurso semelhante ao implementado no X, de Elon Musk.
Portanto, embora haja uma clara discordância em torno dos combustíveis fósseis, a aliança entre Trump e Musk parece ser alimentada por interesses mais amplos. A liberdade nas redes sociais e o controle da narrativa política são pontos cruciais para ambos. Para Musk, o sucesso do X depende em parte de manter uma base de usuários ativa e engajada, o que poderia ser prejudicado por políticas mais rígidas de controle de desinformação. Para Trump, o acesso irrestrito às plataformas digitais é vital para mobilizar sua base eleitoral.
O ponto de inflexão pode vir quando a economia verde se tornar inevitável e a Tesla começar a enfrentar desafios diretos devido às políticas pró-combustíveis fósseis. O desestímulo para compra de elétricos pode, eventualmente, vir a ser um ponto de quebra nessa relação. Até lá, Musk parece disposto a jogar em diferentes tabuleiros, mantendo um delicado equilíbrio entre seus interesses empresariais e políticos. Afinal, para o magnata que conquistou tanto nas áreas de inovação tecnológica e espacial, o jogo político é apenas mais um campo de batalha a ser explorado – desde que haja espaço para crescer, seja na Terra, em Marte ou no X.
