O julgamento pela morte do craque Diego Maradona começou na terça-feira 11 no Terceiro Juizado Criminal de San Isidro, na Argentina. Dia de emoções à flor da pele, o promotor Patricio Ferrari mostrou uma foto do ex-jogador minutos após morrer em sua cama e acusou os médicos de tê-lo negligenciado em seus últimos dias. “Foi assim que Maradona morreu”, afirmou, num dos momentos mais dramáticos na corte.
Maradona morreu em 25 de novembro de 2020, após realizar uma cirurgia para retirar um coágulo cerebral e passar a vida lutando contra o vício em álcool e cocaína. Sete membros da equipe médica que cuidavam dele no pós-operatório são acusados de “homicídio simples com dolo eventual”, ou seja, de saberem das consequências fatais de seus atos. Os acusados enfrentam penas de entre oito e 25 anos de prisão.
Mostrando a foto, Ferrari se dirigiu aos juízes responsáveis — Maximiliano Savarino, Julieta Makintach e Verónica Di Tomasso. “Aqueles que vêm dizer que não perceberam o que estava acontecendo com Diego estão mentindo na cara de vocês. O estado foi eloquente. Eles estão mentindo para vocês se não dizem que participaram de um assassinato”, afirmou.
Os rostos dos médicos acusados de negligenciar a saúde do ídolo argentino ficaram tensos. Dalma e Gianinna Maradona, filhas do futebolista, choraram em silêncio. Ao seu lado, também movidas pela angústia, estavam Jana Maradona, filha que o jogador teve com Valeria Sabalain, e a ex-companheira de Maradona, Verónica Ojeda, cujo filho, Diego Fernando (o Dieguito), publicou um vídeo nas redes sociais exigindo justiça para o pai.
Os ânimos já estavam acirrados antes mesmo da audiência. Um grupo de algumas dezenas de fãs do jogador se reuniram na entrada do tribunal de San Isidro e hostilizaram os réus. Segundo a imprensa argentina, Ojeda, xingou a psiquiatra Agustina Cosachov de “cachorra mal parida”, ainda na calçada.
Nesta quinta-feira, 13, o julgamento será retomado em San Isidro. Questões preliminares serão discutidas primeiro e então o depoimento das testemunhas começará. O julgamento deve terminar por volta de julho. Há cerca de 120 testemunhas convocadas.
Como Diego Maradona morreu
Em consonância com o Ministério Público, Fernando Burlando, advogado das filhas, afirmou que Maradona “foi assassinado” em decorrência de “um plano desumano que se mostrou eficaz”. “Muitas pessoas não podem estar erradas, nem podem levar uma pessoa à morte dessa maneira”, argumentou ele.
Nos oito dias anteriores a 25 de novembro de 2020, quando Maradona desembarcou de um avião aos 60 anos em uma casa de campo no bairro do Tigre, nos arredores de Buenos Aires, bastava “levá-lo a um pronto-socorro” para “salvar sua vida”, segundo o advogado. O ídolo do futebol morreu em decorrência de “parada cardiorrespiratória secundária a edema pulmonar agudo causado por insuficiência ventricular esquerda aguda”. Não havia desfibrilador na casa.
Além disso, Burlando os acusou: “Nenhum dos réus fez o que tinha que fazer, porque não queria.” O promotor Ferrari também qualificou a internação domiciliar, na qual o campeão do Mundo de 1986 se recuperava da neurocirurgia, como “temerária, deficiente e sem precedentes” e disse que a equipe médica não seguiu nenhum protocolo e descreveu o local como “um teatro do horror”.
Os acusados são o médico Leopoldo Luciano Luque (44); a psiquiatra Agustina Cosachov (40); o psicólogo Carlos Angel Diaz (33); Nancy Edith Forlini (56), coordenadora do prestador médico contratado; Mariano Ariel Perroni (44), coordenador da Medidom S.R.L.; Ricardo Omar Almirón (41), enfermeiro; e o médico clínico designado para internação domiciliar, Pedro Pablo Di Spagna (52).
A enfermeira Gisela Dahiana Madrid, que encontrou o corpo de Maradona, também é acusada, mas enfrentará um julgamento com júri no segundo semestre deste ano, quando o julgamento principal for concluído.
Os réus mais apontados pela defesa de Dalma e Gianinna são os médicos Luque e Cosachov, que teriam liderado os cuidados com o corpo de Maradona.
Defesa
Depois de Burlando, os advogados de Luque, Mara Carla Digiuni e Julio Rivas, declararam que tentarão absolver o médico porque “ele agiu com responsabilidade”. “Luque não participou de nenhuma das circunstâncias alegadas contra ele”, sustentou Digiuni, ao classificar a morte de Maradona como um “evento cardíaco imprevisível”.
Luque era o médico pessoal de Maradona e foi quem solicitou que ele voltasse para casa após a cirurgia. Os promotores Cosme Iribarren, Laura Capra e Patricio Ferrari acreditam que o neurocirurgião “não forneceu informações sobre a saúde de Diego para Dalma, Gianinna e Jana”. Além disso, ele teria falsificado uma assinatura em uma solicitação de registros médicos.
Ele é acusado de minimizar sintomas consistentes com insuficiência cardíaca e de não fazer exames de acompanhamento nem chamar especialistas. Por meio de seu advogado, ele anunciou que não comparecerá às próximas audiências e solicitou ser notificado com antecedência sobre a data em que testemunhará para que possa “se organizar”.
O advogado da psiquiatra também pediu a anulação. “Não há relação causal comprovada entre as ações do meu cliente e a morte de Diego Maradona”. Ele sustentou que, após quatro anos, ainda não era possível provar o que causou a parada cardíaca fatal.