O Brasil é um país de potencial inquestionável, mas sua trajetória é marcada por escolhas que frustram o avanço. Em vez de capitalizar sobre momentos de estabilidade, o país se acomoda em soluções imediatistas, negligenciando as reformas que garantiriam um crescimento sustentável. Hoje, essa dinâmica se repete, com um governo que se contenta com uma visão limitada e doméstica da economia, sem estratégia geopolítica para ampliar a influência do país no cenário global.
Essa falta de visão estratégica não é recente. Em 1988, enquanto o mundo passava por mudanças estruturais profundas, o Brasil redigia sua Constituição sem perceber o colapso iminente da União Soviética e a ascensão de uma nova ordem global. Enquanto economias abertas se preparavam para a globalização, reforçamos um modelo estatal pesado e burocrático, engessando o orçamento e criando entraves ao desenvolvimento. Perdemos, naquele momento, a chance de escrever um documento moderno que impulsionasse o país para um nível mais alto de competitividade econômica.
Nos anos 1990, tivemos outra grande oportunidade. O Plano Real foi um marco, controlando a inflação e proporcionando estabilidade macroeconômica. Mas o momento de ajuste não foi aproveitado para reformas estruturais que consolidassem um ambiente de crescimento sustentado. Perdemos tempo em debates políticos e corporativistas e não conseguimos reduzir o tamanho do Estado nem flexibilizar o orçamento público. Como resultado, entramos no século XXI com uma economia ainda engessada e um setor produtivo sufocado por tributos e burocracia.
Na década de 2000, o Brasil surfou a onda do boom das commodities, um período em que os preços internacionais favoreceram nossas exportações e encheram os cofres públicos. Era o momento ideal para transformar essa bonança em desenvolvimento duradouro por meio de investimentos em infraestrutura, educação técnica e inovação. No entanto, o que se viu foi um modelo baseado em expansão do consumo via crédito fácil e aumento do gasto público, sem planejamento estratégico para os anos seguintes. Quando o ciclo das commodities se encerrou, o país ficou sem respostas e mergulhou em uma crise econômica severa.
Agora, vivemos outro momento de transformação global. A revolução digital está reconfigurando a economia e o trabalho de maneira ainda mais impactante do que a Revolução Industrial. Inteligência artificial, automação e novos modelos de negócios surgem a uma velocidade inédita. Enquanto isso, o Brasil permanece perdido em disputas políticas internas, sem um plano claro para se inserir nessa nova era. Mais uma vez, corremos o risco de ficar à margem do futuro, repetindo os erros do passado.
O atual governo insiste que o crescimento pode ser sustentado pelo aumento dos gastos públicos, sem oferecer um plano para equilibrar as contas e tornar o país mais competitivo. Essa estratégia compromete a credibilidade fiscal e afugenta investimentos de longo prazo. As reformas propostas, como a tributária e o novo arcabouço fiscal, são excessivamente politizadas e geram pouco impacto real, ampliando a sensação de incerteza para empresas e investidores.
Outro entrave crítico é a rigidez orçamentária. Dados do Orçamento Geral da União para 2024 indicam que 91,6% das despesas primárias são obrigatórias, restando apenas 8,4% para investimentos estratégicos. Gastos previdenciários (R$ 913,7 bilhões), transferências constitucionais (R$ 516,5 bilhões) e despesas com pessoal (R$ 380,4 bilhões) consomem praticamente todo o orçamento, deixando o país sem margem para inovação e modernização. O problema não é a falta de dinheiro, mas sim a forma como os recursos são alocados.
A análise da relação entre PIB e participação no comércio mundial reforça a estagnação do Brasil. Somos a 8ª maior economia do mundo, com um PIB de US$ 2,3 trilhões, mas nossa participação no comércio global é de apenas 1,3%. A Alemanha, com um PIB de US$ 4,6 trilhões, responde por 7% do comércio mundial, evidenciando como estamos aquém do nosso potencial. Economias bem-sucedidas entenderam que crescimento e abertura comercial andam juntos, mas o Brasil ainda insiste em barreiras regulatórias e burocráticas que inibem sua inserção nas cadeias globais de valor.
Reformas estruturais são urgentes, mas demandam mais do que habilidade técnica. Precisamos de liderança política capaz de construir consensos e superar divisões ideológicas. O modelo de governança precisa ser revisto. Operamos um presidencialismo disfuncional, com traços de parlamentarismo que paralisam a capacidade de decisão. Ajustar esse desequilíbrio é essencial para garantir estabilidade e previsibilidade.
Além disso, o Brasil segue como uma das economias mais fechadas do mundo, restringindo a concorrência e dificultando o acesso a novas tecnologias. A abertura comercial não é uma ameaça, mas sim uma necessidade para impulsionar a inovação e a produtividade. No entanto, essa abertura deve vir acompanhada de um ambiente regulatório mais simples e previsível, que favoreça o empreendedorismo e estimule a modernização do setor produtivo.
O Estado também precisa redefinir seu papel. Hoje, a máquina pública ocupa setores que poderiam ser liderados pela iniciativa privada, drenando recursos que deveriam estar direcionados à infraestrutura, segurança e inovação. Privatizações e parcerias público-privadas não são dogmas ideológicos, mas ferramentas essenciais para ampliar a eficiência e garantir que o Estado foque no que realmente importa.
O maior problema, contudo, é o impacto dessa estagnação sobre as novas gerações. O Brasil, administrado sem visão de longo prazo, gera frustração entre jovens talentos, que cada vez mais buscam oportunidades no exterior. Não se trata de falta de investimento em educação – o país já destina uma parcela significativa do PIB ao setor. O problema é a má gestão dos recursos, a ineficiência do sistema e a desconexão entre a formação acadêmica e as exigências do mercado. Um país que não valoriza sua juventude e não cria um ambiente propício para que ela prospere está condenado à mediocridade.
O Brasil precisa de ambição. A história está repleta de momentos em que poderíamos ter mudado de patamar e hesitamos na escolha do caminho. Agora, diante de mais uma revolução global, estamos, novamente, distraídos com disputas internas e sem um plano real para o futuro.
A escolha é clara: continuar no ciclo de oportunidades desperdiçadas ou, finalmente, assumir o protagonismo que nossa dimensão econômica e demográfica nos permite almejar. Enquanto isso não acontece, seguimos especialistas na arte de nunca perder a oportunidade de perder uma oportunidade.
*Gustavo Diniz Junqueira é empresário e atua nos conselhos de administração do fundo Exagon, da Alper Seguros, da AgriBrasil e da Capturiant. Foi secretário estadual de Agricultura em São Paulo