Um novo ano traz esperança e alguns (não tão) novos desejos. O fim de um ciclo e a renovação do espírito são razões que nos levam a acreditar em mudanças nesta época. Com 2025, não é diferente. O ano começa com listas de desejos e votos, frequentemente voltados aos cuidados com o bem-estar físico e mental.
Como nefrologista, meu desejo número 1 é o de saúde dos rins para todos. Uma aspiração que precisa transcender as campanhas – como o Dia Mundial do Rim, comemorado em março – e se materializar em conscientização e políticas públicas robustas, que assegurem acesso integral, equitativo e universal à prevenção, ao diagnóstico e ao tratamento da doença renal crônica.
A doença renal crônica afeta uma em cada dez pessoas no Brasil. Ela pode progredir silenciosamente até seus estágios avançados, quando o tratamento é menos eficaz em retardar a doença e os custos dos cuidados aumentam exponencialmente. Por isso, é importante o investimento na prevenção e no diagnóstico precoce, antes mesmo do aparecimento de sintomas.
Medidas preventivas incluem programas de educação em saúde, hábitos de vida saudáveis e identificação de fatores de risco, como hipertensão, diabetes, tabagismo e obesidade. O diagnóstico precoce requer métodos simples e baratos, como os exames de urina e da creatinina no sangue. No entanto, por desconhecimento, muitos brasileiros ainda não têm acesso a esses exames básicos.
O cuidado integral vai além da detecção precoce e inclui acompanhamento contínuo e tratamentos personalizados, respeitando as escolhas dos pacientes – do tratamento conservador ao transplante renal. Isso exige o fortalecimento da Atenção Primária à Saúde e a garantia de acesso rápido à atenção especializada.
Esse cuidado também deve considerar as necessidades de pacientes pediátricos, que enfrentam desafios únicos, com impactos no crescimento e desenvolvimento, e necessitam de um sistema de saúde que acolha essas particularidades de forma ágil e humanizada.
Infelizmente, sabemos que muitos pacientes são diagnosticados em fase avançada. Nesse contexto, a terapia renal substitutiva é essencial. Atualmente, mais de 150 mil brasileiros estão em diálise, sendo 76% no SUS.
O país enfrenta uma crise humanitária no setor, causado pelo subfinanciamento crônico. Faltam vagas e há morte de pacientes, sem acesso ao tratamento. O aumento do custo operacional, somado a um teto de financiamento defasado, tem levado diversas clínicas de diálise ao limite, comprometendo a expansão necessária para acompanhar o crescimento da demanda. A interrupção dos serviços coloca em risco a vida de milhares de pacientes.
O direito de escolha do paciente também está comprometido. Modalidades como a diálise peritoneal, que possibilita a realização do tratamento no domicílio do paciente e é, frequentemente, mais econômica para o sistema, tem enfrentado um declínio preocupante no país. Em 2010, era oferecida a 9,4% dos pacientes; hoje, menos de 4% realizam diálise peritoneal no Brasil. Esse declínio reflete barreiras logísticas, desconhecimento e, principalmente, falta de políticas públicas de saúde que incentivem a modalidade.
Reverter essa crise exige uma revisão urgente da tabela de remuneração do SUS, assegurando recursos adequados, que cubram os custos reais, e possibilitem a expansão da oferta de vagas.
Além disso, é preciso implementar políticas que garantam equidade no acesso às diferentes terapias. A nefrologia brasileira, por meio de entidades como a Sociedade Brasileira de Nefrologia, a FENAPAR e a Frente Parlamentar da Nefrologia, tem coordenado esforços contínuos para sensibilizar gestores e a sociedade sobre a gravidade da situação. Um pacto nacional pela saúde renal é indispensável, mobilizando esforços de todos os setores para soluções sustentáveis.
“Saúde dos Rins para Todos” exige vontade política, alocação de recursos e engajamento coletivo de profissionais de saúde, população e gestores públicos. Que 2025 seja o ano em que a prevenção, o diagnóstico precoce, o cuidado integral e o acesso ao tratamento se tornem realidade para todos os brasileiros com doenças renais.
* José A. Moura Neto é nefrologista e presidente da Sociedade Brasileira de Nefrologia